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Calabacho

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Para quem souber o que é uma enxada rasa ou de graviões, o rabo de um charrueco, um foice roçadoira, uma gadanha, o frenesim empoeirado das eiras ou a festa terrível da amansia, repare só: compra-se a uma vendedeira barroa, um queijo de cabra fresco, dos pequenos. Enche-se a caldeira com água, esfanica-se, para dentro, o queijo em pedacitos miúdos, põe-se ao lume e, quando quase quente, que remédio se não deitar pão duro. Se, por acaso o queijo for rijo, pois raspa-se fininho e segue-se igual preceito. Depenica-se. Uma enxada rasa ou de gaviões, o rabo de um charrueco, uma foice roçadoira, uma gadanha, o frenesim empoeirado das eiras ou a festa terrível da amansia, não, não dizem fainas mesmo nada violentas. Na época das grandes crises, após o encantamento das colheitas e a solenidade das adiafas, ou dentro da melancolia dos outonos e da agonia dos invernos, a fome espreita as velhas casas de taipa. Cíclica, mas nunca esperada com previdência. No deserto da boa vida, os homens olham a miragem do trabalho. As crianças choram pão com o conduto de toucinho cru ou de azeitonas. Ou mesmo só pão, mas pão. É a hora das mercearias deixarem de fiar. Ocasião também para que, conhecedoras das dificuldades da família, certas marafonas, as vacas de entralho, venham melieiras, a soldo de homens ricos, tentar prostituir as mais novas e bonitas. Então, no momento dorido, as mulheres embiocadas, canos de abaixo dos joelhos até aos tornozelos, pés em tamancos pretos de rastro de madeira, vergadas sobre o chão rezam ao surgimento das ervas no templo imenso de Ceres.

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